sexta-feira, 20 de maio de 2011

Meu corpo, minha vontade

Minha amiga Fernanda me mandou pelo Face uma matéria na folha sobre "A marcha da vadias", um movimento que começou nos Estado Unidos em que mulheres protestam pelo direito não só de se vestirem como quiserem, mas de poderem denunciar estupros ou ameaças sem serem consideradas "culpadas" pelo que aconteceu por se vestirem de maneira provocante. No meu entender, o nome da marcha é uma ironia com a maneira como algumas mulheres são vistas e com declarações como : "se as mulheres se vestissem de maneira mais recatada, não estariam tão sujeitas a serem atacadas". os comentários feitos por leitores ( me questiono se as pessoas leram) eram na maioria horrorosos, simplesmente reafirmavam que o grande problema das mulheres de hoje é "não se darem ao respeito" e que por isso estavam sujeitas sim ao estupro e talvez até merecessem.
Não sei se todas as mulheres se sentem assim, mas estupro sempre foi meu maior medo. Claro que todos nós corremos riscos, saímos na rua e podemos ser assaltados, levar um tiro, apanhar de bandidos. Quando se trata de estupro porém o que mais me aflige é a ideia da violação, da impotência, da degradação do seu corpo e do seu espaço por aquela pessoa. Sexo é um ato ligado a prazer, intimidade e de repente você se vê forçada a fazer sexo, como se seu corpo não te pertencesse. Esse pra mim é o maior horror de um estupro, o seu corpo deixa de te pertencer e é invadido por outro.
Um estuprador não se excita com a visão do corpo de uma mulher, da maneira como um homem normal se excita. O prazer para o estuprador está na dor e na humilhação que ele causa. Se ao ser abordada a mulher concordasse em fazer sexo com o estuprador ele normalmente desistiria, por isso não existe uma maneira mais "segura" de se vestir, não existe "provocação". O estuprador se aproveita de um momento e escolhe aleatoriamente, o que o excita é o ato. A mulher é apenas o canal pra sua perversão.
Fico pensando em como se enxergam esses homens que dizem que alguém só é estuprada por ter provocado, será que se acham tão fracos, tão bestiais, tão animalescos que ao ver uma saia mais curta ou um decote mais profundo não serão capazes de se controlar ? Será que pensam a mesma coisa de seus pais, irmãos, avós, filhos? Quando foi que desaprenderam a considerar a vontade dos outros? Se o chefe lhes nega um aumento, será que eles lhe dão um tiro na cara? Quebram toda a casa porque acabou o leite? Atacam outros homens quando dividem o mesmo espaço? Porque um instinto é incontrolável e o outro não?
Tenho sorte de ter homens íntegros na minha vida, com certeza olham quando passa uma mulher com uma roupa mais justa, mas não a julgam merecedora de violência por causa disso.
Mas o problema pra mim começa com essa mentalidade de "merecimento" ou "provocação". O que ela esconde, além de uma visão absurda de uma coisa tão horrível quanto um estupro é a falta de consideração com a vontade expressa por uma mulher, para alguns homens quando uma mulher diz não ela está apenas jogando. O "não estou interessada" vira um "continue tentando, estou me fazendo de difícil". Uma vez um homem me seguiu saindo do meu trabalho depois de eu repetir várias vezes que não tinha interesse nele, depois de ter sido ignorado por mim, depois de receber negativas até mais duras. Era noite e eu estava de uniforme, um uniforme que eu posso assegurar, nada tinha de atraente, mas ele achou que tinha o direito de tentar me forçar a ceder e por fim ficou irritado e até um pouco violento. Temos aí então um caso em que meu corpo não foi atacado ( Graças a Deus) mas a minha vontade foi. Fui constrangida, seguida e aterrorizada por um homem que simplesmente não entendeu que minha negativa tem tanto valor quanto a dele, e quando eu digo aterrorizada não estou exagerando, qualquer mulher sozinha que já foi seguida a noite por um homem estranho sabe o que estou dizendo.
Esse homens então, que acham que uma mulher que se vista de maneira provocante ( e nem vamos tentar entender o que seria provocante, senão eu escrevo um livro) está sim "chamando" um estuprador, não só estão denegrindo a própria imagem, ao se igualarem a bestas movidas por instintos e sem o mínimo de racionalidade, pra mim, muitos desses homens são os cotidianamente desrespeitam a vontade e a negativa de uma mulher e não entendem que eles também podem ser rejeitados. São os que desclassificam as mulheres que não os querem ou que os superam em alguma coisa. São por fim homens violentos, não fisicamente, já que a violência física contra a mulher é mal vista e difícil de justificar, mas emocionalmente violentos.

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